domingo, 31 de janeiro de 2010

TRENDS BRASIL - Tendências de Negócios para Micro e Pequenas Empresas

As vinte tendências selecionadas pelos autores do livro foram:

- Tendência 1: Consumo precoce
- Tendência 2: Crescimento do número de animais de estimação
- Tendência 3: Disseminação do conceito de Responsabilidade
- Tendência 4: Sentimento de brasilidade
- Tendência 5: Ênfase na singularidade
- Tendência 6: Retorno a valores tradicionais/ onda retrô
- Tendência 7: Aumento da busca espiritual e mística
- Tendência 8: Crescimento do mercado afro-descendente
- Tendência 9: Preocupação com a estética e aparência
- Tendência 10: Grande número de pessoas morando sozinhas
- Tendência 11: Filhos morando mais tempo com os pais
- Tendência 12: Grande número de casais sem filhos
- Tendência 13: Aumento da população + 60
- Tendência 14: As pessoas estão passando mais tempo em casa
- Tendência 15: Aumento da sensação de insegurança nas pessoas
- Tendência 16: Consumo de ecossoluções
- Tendência 17: Busca pela experienciação / experimentação
- Tendência 18: Envolvimento com o mundo digital
- Tendência 19: Prioridade à saúde
- Tendência 20: Convivência entre o global e o local

No mundo dos negócios as tendências exercem influência sobre tal, desta maneira os empreendedores precisam estar preparados e capacitados para as repentinas mudanças, modelando os empreendimentos para esse novo momento. Dentre as tendências citadas, a tendência 17 merece atenção especial, pois se trata das experiências vividas.

As pessoas estão, cada vez mais, interessadas em ter novas experiências de vida, o que implica, por exemplo, o crescimento do turismo de experimentação.

Busca pela experienciação/experimentação

Algo que se percebe com um fenômeno crescente na sociedade contemporânea é o desejo das pessoas em “ter a experiência de...”, no sentido de viver situações bastante incomuns em relação à sua vida cotidiana, como num exercício de empatia que possibilite viver “outras vidas”. Não se trata apenas de experimentar coisas, novas vai, além disso, implica viver novos papéis. Tem gente que se pergunta como será viver a vida de um trabalhador do campo e então se hospeda por uma semana numa fazenda e passa a trabalhar na lida diária tal como um peão. Passa pela experiência de ser um peão por uma semana. Outros gostariam de sentir como é a vida numa favela e se inscrevem em programas de intercâmbio de férias para durante um mês: morar, trabalhar, viver e ajudar as pessoas numa favela.
Hoje, tem muita gente interessada e disposta a viver novas experiências, a trocar de lado, trocar de área, de campo, de vida. Nem que seja por um breve período. Gente com vontade de “colocar a mão na massa” e experimentar como seria sua vida em outras condições, em outras atividades, em um outro ambiente. Isso abre um universo de possibilidades de negócios novos e de inovações em negócios tradicionais pode resultar em bons negócios.

Razões dessa tendência

Essa tendência tem bastante a ver com o espírito do “homem do século XXI”, que conquistou a liberdade de se expressar e de sentir o que lhe der vontade. Há, nos dias de hoje, uma espécie de Renascença – Parte 2, na qual o foco passa a ser novamente o homem, com suas circunstâncias, dramas, aspirações, sonhos e desejos. Isso como um contramovimento ao processo de massificação dos comportamentos, dos costumes e de estandartização do consumo, provocados pelo fenômeno da globalização.
Depois de algumas décadas de ênfase na ideologia e no coletivo, o ser humano parece disposto a recuperar o tempo perdido, a viver intensamente sua vida e ter as mais diversas experiências.Essa é uma das razões de várias tendências comportamentais, como a da busca pela singularidade, que já referimos anteriormente. Além disso, o desenvolvimento tecnológico ampliou essa liberdade uma vez que facilitou os processos produtivos, dando mais tempo para que as pessoas pensem em si, e multiplicou os canais de comunicação e de acesso à informação.
Outra razão dessa tendência, talvez, esteja na busca dessas pessoas em perceber, entender e construir sua própria identidade a partir de um contexto completamente diferente daquele que vive no seu dia-a-dia, como que se colocando “fora de sua vida” para vê-la em perspectiva e poder afirmar ou redefinir seus rumos. Isso, provavelmente, explica melhor essa busca pela experiência, do que vê-la apenas como um exercício de hedonismo, de prazer sensorial e busca de novidades.

Impacto sobre os negócios

Um dos impactos que essa tendência pode exercer sobre os negócios é o de obrigar os empreendedores a pensar diferente, a ver novas oportunidades de receita naquilo que já fazem. Na medida em que há pessoas interessadas em ter “experiências de...”, por que não oferece oportunidade disso no negócio que já temos? Se, por exemplo, você possui ou administra uma fábrica de móveis, pode pensar em abrir possibilidade para marceneiros amadores viverem a experiência de trabalhar num ambiente profissional de fabricação de móveis. Pode ser um curso rápido de uma semana, no qual os alunos farão móveis de verdade, do catálogo da empresa. Ou se você possui uma oficina mecânica, pode fazer o mesmo, para que pessoas apaixonadas por carro ou mecânicos de finais de semana possam vivenciar o dia-a-dia de mecânicos profissionais. O mesmo raciocínio pode ser usado nos mais variados segmentos de negócios.
Essa tendência também representa oportunidades para o empreendedor que estiver disposto a viabilizar e oferecer condições para que esse público viva as experiências desejadas. Um empreendedor pode organizar grupos de pessoas interessadas em passar um período de tempo numa colônia de pescadores, por exemplo, ou numa comunidade de tecelões no interior da Paraíba, ou ainda, entre os trabalhadores de uma vindima. O turismo de experimentação pode representar boas oportunidades de negócios.
Além disso, essa ideia de que há um número significativo de pessoas interessadas em viver novas experiências pode ser um interessante mote mercadológico para empresas das mais diversas áreas. Uma montadora poderia oportunizar que clientes fiéis de sua marca acompanhem de perto a fabricação de seu automóvel, usando essa possibilidade como apelo do marketing promocional. As empresas devem estar atentas e abertas a oferecer tais oportunidades de experienciação a seus clientes.

Sugestões de negócios
Agência de experienciação
Um negócio óbvio para aproveitar essa tendência é criar uma agência especializada em projetos de experienciação. Tal agência deve ser um misto de agência de turismo com agência de promoção de pessoas em projetos já existentes – turismo rural, por exemplo – como, também, criar seus próprios projetos (obviamente, sem prescindir do realismo, básico na experienciação).
Tais projetos dependerão da região geográfica e da parcela de público a que a nova empresa pretenderá atender e, ainda, da dimensão que o empreendedor planeja dar a esse negócio. Sendo assim, pode-se imaginar desde pequenos projetos locais, como participações e colheitas de hortifrutigranjeiros no cinturão verde da cidade, como ter um âmbito nacional ou internacional. Como colher uvas no Vale dos Vinhedos (indicação geográfica reconhecida pelo INPI em 2002), ou um curso de queijaria numa fazenda mineira.
Essa agência precisa pesquisar, de alguma forma, o seu público preferencial e conhecer-lhe os gostos pessoais, sonhos e desejos latentes, disponibilidade de tempo recursos, enfim, o maior número de informações que possibilite identificar experiências que venham a despertar-lhes o interesse.
Sensibilidade, criatividade e capacidade de organização e articulação são indispensáveis para um negócio desse tipo. Um excelente exemplo é a empresa portuguesa. A vida é Bela. Dê uma olhadinha no site da empresa (www.avidaebela.com) e veja que genial.

Cursos especiais com experienciação
Em vez de oferecer experiências pontuais e breves como no caso da agência citada anteriormente, você pode empreendera formulação de cursos como uma duração um pouco maior, que proporcionem aos alunos uma experienciação efetiva no campo de interesse daquele curso e que lhes sirva para a vida toda.
Exemplo: cresceu muito nos últimos anos o interesse dos brasileiros por vinho. Já existem inúmeros especialistas profissionais e um número maior ainda de especialistas amadores. Muitos desses gostariam de entender mais de vinho, tal como um sommelier e ter a experiência de trabalhar um tempo que seja como tal.
Na maioria das cidades brasileiras, não existem cursos que formem sommeliers, muito menos que proporcionem aos alunos uma vivência prática num restaurante com uma boa adega. Pode ser que isso encontre mercado.
Essa é apenas uma possibilidade. Mas, existe um sem-número delas. Tem gente que adora cantar e que adoraria participar de um curso de canto e música, que ao final proporcionasse cantar por um tempo num bar noturno, por exemplo, ou gravar um CD. Outros gostam muito de construção e estariam dispostos a participar de um curso prático para formação de pedreiros e, depois, poder exercitar seus aprendizado prestando trabalho social em comunidades carentes da cidade. O mesmo raciocínio serve para uma afinidade de outros possíveis cursos.

Espaços dos Sentidos
Esse desejo de experienciação tem muito a ver com o exercício dos sentidos. Um negócio que talvez possa ter êxito é um espaço, num shopping Center ou numa outra área de grande movimentação de público, que ofereça essa possibilidade de exercitar os sentidos (tato, audição, olfato, paladar e visão) de forma lúdica.
Tal espaço poderia oferecer possibilidades inusitadas para que as pessoas exercitem seus sentidos, experimentando gostos exóticos, perfumes e aromas desconhecidos, texturas e formas diferentes, sons raros, enfim, um universo sensorial todo novo. O usuário poderia passar por um teste ao estilo “quis” para ver se consegue descobrir a origem dessas novas sensações.
A idéia básica é proporcionar ás pessoas experimentações e sensações novas. Assim, nesse espaço, o usuário poderá sentir como é a textura de uma espoja do mar ou do barro de oleiro, ouvir o som de pássaros exóticos ou ainda experimentar o gosto de um tempero indiano ou de um doce árabe. É, sem dúvida, um negócio diferente e criativo.

Dicas para negócios existentes
Um fabricante ou varejista de colchões poderia criar cabines em aeroportos para que o público possa experimentar seus produtos enquanto descansa por um tempo. Oferecer experimentação em ambientes inusitados pode ser uma boa estratégia de marketing.
Uma escola de natação poderia oferecer um final de curso diferente, oportunizando a seus alunos uma experiência nova: nadar com os golfinhos, por exemplo. Ou participar de prova de travessia de rios ou, ainda, nadar com um atleta olímpico.
Um fabricante ou varejista de ar-condicionado poderia criar um ambiente de praia na serra, ou vice-versa, oportunizando ao público experimentar a sensação de estar noutro lugar. A mesma idéia poderia ser usada na divulgação de destinos turísticos. O inverno gaúcho poderia ser promovido no Nordeste por meio de um ambiente climatizado: ou as praias de Alagoas serem promovidas no Sul através de um ambiente aquecido e com motivos praianos.
No futuro, a nanotecnologia poderá ser uma grande aliada nesse tipo de iniciativa, uma vez que poderá oportunizar sensações, cheiros, ambientação na medida em que os componentes que se utilizem possibilitem exalar perfumes, hibridismo de cores, toque mais macio, etc.

Fonte: Kakuta, Susana. Trends Brasil: tendências de negócios para micro e pequenas empresas. Júlio Ribeiro. Porto Alegre: SEBRAE/RS, 2007, páginas 125 a 130.

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

Alinhavando o Mundo

Por ANAND GIRIDHARADAS

CARTAGENA, COLÔMBIA — Nossa tendência é pensar que as máquinas conectam o mundo, mas, na verdade, são as pessoas. No passado, eram os peregrinos e exploradores e colonizadores que, de várias maneiras gentis e cruéis, promoviam a troca entre os povos. Foram eles que deram a esta cidade em tons pastel no Caribe seus arcos Hispano-Islâmicos, uma cozinha que pode misturar tamarindo e bife e milho num único prato, e ritmos de salsa em dívida com os passados Europeus e Africanos.
Atualmente não são os peregrinos ou colonizadores que nos unem, mas uma nova classe de conectados globalmente que estão implacavelmente polinizando a comunidade humana. Estes estão se tornando, culturalmente, algumas das pessoas mais importantes do mundo, mas conhecemos pouco sobre eles como parte de uma classe.
Tive encontros próximos com estes em Mumbai e Nova Deli, Washington e Cambridge, Bangkok e Hong Kong, e agora nesta percussora cidade colombiana. Observei como estes alinhavam o mundo, uma recomendação de um restaurante e um pedido de um amigo por vez, e esta coluna é em homenagem a eles.
Estes se apresentam em vários tipos, embora alguns deles se enquadrem em mais de um:
THE ANOINTERS (OS CONSAGRADOS) Estes são recém adotantes geográficos: investidores que apostam em locais calmos, porém, arriscados, que veem volumosos retornos quando o receio finalmente segue a tendência; os turistas que se aventuram em países perigosos, como é considerado, por muitos, a Colômbia, beneficiando-se dos preços mais baixos e da pouca aglomeração, e então divulgam a nova realidade para os menos ousados; compradores da Bergdorf Goodman que decidem se a semana de moda de Moscou ou Cidade do Cabo tornaram-se suficientemente grandes para serem visitadas; gestores de eventos que decidem onde promover um festival de filmes, uma conferência sobre software ou um debate empresarial.
THE REPLICATORS (OS COPIADORES) Estes são os colonos empresariais: expatriados, diretores para o país e transferidos das empresas procurando não a civilização, mas melhores práticas. Estes vêm de New York e Seul para montar escritórios estrangeiros da Goldman Sachs e Hyundai. O HSBC possui uma equipe especial conhecida como os “Fuzileiros Navais,” que devem estar disponíveis para serem transferidos após alguns dias de aviso. Os Replicators (Copiadores) levam técnicas de gestão de classe mundial aos países em que vivem; os melhores absorvem as novas idéias locais e as aplicam em suas matrizes. Estes frequentemente passam uma quantidade de tempo desproporcional hospedados em hotéis cinco estrelas, mas são aventureiros ao realizar negócios em locais em que isto ainda não é comum e fortalecem o jogo de todos.
THE APPRENTICES (OS APRENDIZES) Estes viajam ao exterior vindos de países menos conectados, são aprendizes nas melhores universidades ou empresas do mundo, e voltam para a pátria para aplicar suas descobertas. Não estão interessados em ficar à toa. Estes trabalharam no seu país de origem; conhecem as oportunidades e lacunas; vêm aprender o que não pode ser aprendido facilmente em casa. Após retornar, estão aptos a implantar novos sistemas e processos, e adaptam modelos estrangeiros às realidades locais. Se os Replicators (copiadores) trazem torres de telefone celular do ocidente para a Índia, os Aprendizes criam empresas de telefonia indianas nos quais moradores de vilas e fazendas confiam.
THE DOCKS (OS DOCAS) Estes são os habitantes locais globalizados das sociedades menos conectadas que servem de recebedores do mundo externo. Estão no local para ficar. São os mantenedores da sua memória institucional, mas falam uma linguagem que os estrangeiros compreendem. Sabem o que em sua sociedade causará maior apelo aos estrangeiros; são especialistas em explicações, que não se cansam de fazer o mesmo passeio altas horas da noite. Vivem nos sites de relacionamento social Facebook e Orkut e aSmallWorld. Possuem conhecimento interno: em Xangai e Buenos Aires, lhe dirão qual é o melhor mergulho local e que alfaiate não tentará lhe ludibriar. Estes são respeitados em suas sociedades porque intermedeiam o acesso de estrangeiros e de oportunidades estrangeiras.
THE SWITCHBOARDS (OS PAINÉIS DE COMANDO) Eles mesmos não vivem em locais interessantes, singulares, mas conhecem todos aqueles que vivem. Quando estão na universidade, fazem amizade com estudantes estrangeiros; cinco anos depois, têm um quarto de hóspedes lhes esperando em vários países. São colecionadores de relações internacionais, e também conectores. Alguém trabalhando com problemas da infância em Zimbábue pode estar muito envolvido na causa para descobrir alguém igualmente envolvido na Bolívia. O amigo Switchboard (Painel de Comando) em comum, insistirá para que estes se conectam e pratiquem a arte preferida do Switchboard: o intro e-mail, com uma frase inteligente como assunto.
THE FUSIONISTAS (OS FUSIONISTAS) São bitudo, ou quase tudo — biraciais, biculturais, bilíngues. São filhos de diplomatas, de imigrantes de primeira geração, os descendentes de emigrados que retornaram. Por muito tempo agonizaram sobre uma identidade dividida, e talvez sofreram durante o ensino médio com sua incapacidade de responder a pergunta “De onde você é ?” Agora, é hora da vingança. Descobriram como transformar confusão hifenizada em vantagens competitivas servindo de pontes culturais. São proprietários de butiques - Onde o Ocidente Encontra o Oriente - no mundo desenvolvido; estes promovem jantares com comida soul e kimchi nos terraços dos apartamentos de New York.
A população conectiva merece maior análise. Estes não são necessariamente as pessoas mais ricas de sua sociedade, mas frequentemente pertencem à educada classe média alta. Compartilham um traço de personalidade inquieta. Julgam-se aventureiros, embora de certa maneira, sejam quase conservadores: longe de ser hippies e mochileiros, passeiam pelo mundo em função do trabalho, não por diversão. Esperam participar dos negócios, não arruiná-los.
Podem temer o compromisso — por exemplo, tendem a ser inquilinos, não compradores, mesmo quando podem comprar. Consideram difícil casar com aqueles menos inquietos e navegantes que eles. Mas, também se esforçam para manter relacionamentos estáveis com outros da sua laia, vagando pelo mundo. As vídeo chamadas no Skype amenizam a anomia que surge com a ambição.
No início, havia um amigo excêntrico, extremamente útil, aqui e ali. Então, parece haver mais e mais pessoas como estas, mas agrupadas em cidades particulares como New York e Xangai. Porém, de modo crescente, estes estão em todo lugar, conectando, ligando, mesmo cidades tropicais longínquas como esta.
Logo, na próxima vez que comer comida Greco-Francesa em Tókio ou assistir um filme de vanguarda Chinês-Americano sobre Pequim ou ouvir em Berlin que Beirute é o novo local de férias, estará observando os peregrinos e exploradores da sua própria era trabalhando.

Torna-se tanto mais fácil como mais difícil vivenciar a sensação de ser um estrangeiro.

Ilustração de C. Corr

Pela primeira vez na história, por todo o mundo, ser um estrangeiro é uma condição perfeitamente normal. Não é mais diferente que ser alto, gordo ou canhoto. Ninguém levanta as sobrancelhas para um francês em Berlin, um zimbabuense em Londres, um russo em Paris, um chinês em New York. O desejo de muitas pessoas, as quais foi oferecida a oportunidade, de viver em países que não o seu, conflita com o consenso político e filosófico estabelecido a muito, que o ser humano é melhor em casa. Os filósofos, é verdade, raramente prosperaram em locais estrangeiros: Kant passou a vida toda na cidade de Königsberg; Descartes foi à Suécia e morreu de frio. Mas, isto não é justificativa para generalizar o conservadorismo dos filósofos a toda a humanidade. O erro da filosofia foi presumir que o ser humano, por ser um animal social, deve pertencer a uma sociedade em particular. Herder, um filósofo prussiano do século 18, lançou conceitos modernos de nacionalismo argumentando que o ser humano apenas poderia ser bem sucedido entre seu próprio povo com o qual compartilha sua língua e cultura. “Cada nacionalidade mantém seu centro de alegria dentro dela mesma,” escreveu Herder.Mesmo um filósofo liberal moderno exemplar, Isaiah Berlin, considerou sedutora este tipo de lógica emocional. “Todos têm o direito de viver em alguma sociedade na qual não têm que se preocupar constantemente com a sua aparência diante de outros, e dessa maneira ser fisicamente corrompido, condicionado a algum grau de duplicidade, disse Berlin em 1992, próximo ao fim de sua vida, explicando seu apoio ao Sionismo. E sim, sem dúvida, muitas pessoas sentem-se muito mais tranquilas com um lar e uma pátria. Mas, e quanto aos outros, que consideram o lar opressor e a estrangeirice libertadora? Destes é a escolha que torna-se tanto mais fácil como mais difícil de exercer a cada ano que passa. Mais fácil, porque a globalização da indústria e da educação extingue fronteiras. Mais difícil, porque há menos locais neste mundo globalizado aos quais é possível ir e sentir-se totalmente estrangeiro ao chegar. Há tempos, é verdade, que na América ninguém pode ser estrangeiro porque todos são estrangeiros. Nas capitais da Europa, essa mesma condição paradoxal, mais ou menos, foi alcançada – especialmente em Bruxelas, a capital com estilo próprio da Europa, em que décadas de migração econômica foram reforçadas pela entrada de burocratas da União Européia. Lá, a animosidade entre belgas falantes das línguas holandesa – e francesa os tornaram estrangeiros uns para os outros, mesmo em seu próprio país. Para compreender plenamente o que significa ser estrangeiro, é necessário ir à África, ou ao Oriente Médio, ou a partes da Ásia. Na Coréia do Sul, no ano passado, 42% da população jamais havia, conscientemente, falado com um estrangeiro. Bem, é melhor que estes estejam preparados. O número de residentes estrangeiros no país dobrou nos últimos sete anos, para 1.2mi, ou mais de 2% da população. E esta parcela pode aumentar: a média de nascidos estrangeiros no mundo rico é maior que 8% de uma determinada população.


Estrangeiros por excelência
A experiência normalmente mais satisfatória de estrangeirice—completa mistificação, mas sem sensação de rejeição—provavelmente ainda é sentida ao passar algum tempo no Japão. Para o estrangeiro, o Japão é uma nação parecida com a Disneylândia, na qual todos têm um papel bem definido a desempenhar, incluindo o estrangeiro, cuja tarefa é ser estrangeiro. Tudo contribui para facilitar esta atuação, incluindo uma enorme barreira linguística. Os japoneses acreditam que sua língua é tão difícil que contribui como algo que impede um estrangeiro de falá-la. A religião e a moralidade parecem estar tranquilamente longe das normas Cristã, Islâmicas ou Judaicas. As inquietações sobre o Japão poder se ocidentalizar, cultural e economicamente, foram atenuadas pelo crescimento da influência chinesa. Este está se tornando mais asiático, não menos.Mesmo no Japão, no entanto, os estrangeiros pararam de funcionar como objetos de veneração, estudo e ocasionalmente consumo. Era uma vez, nos mundos antigos e medievais, que para ser considerado realmente um estrangeiro, era necessário procurar uma vida entre pessoas de diferente cor de pele ou religião. Estas, provavelmente, estão a uma distância impossivelmente longa, estas provavelmente lhe matariam quando você chegasse, e se você fosse muito adiante poderia cair da extremidade do mundo. No alvorecer de uma era de viagens, ao escrever um código legal imaginário para uma sociedade Utópica que chamou de Magnésia, Platão dividiu os estrangeiros em duas categorias principais. “Aliens residentes” aos quais era permitido estabelecer-se por até 20 anos para realizar os trabalhos indignos dos Magnesianos, como o comércio varejista. Os “Visitantes temporários” consistiam de embaixadores, mercadores, turistas e filósofos. Amplie esta última categoria para incluir todos os estudantes, e você terá uma taxionomia de viajantes que se mostrou efetiva até a invenção das despedidas de solteiro. Ser um estrangeiro tornou-se mais simples a partir do século 17, quando a Europa adotou um sistema político baseado nos estados-nação, cada um com fronteiras, soberania e cidadania. Com os documentos de viagem em mãos, era possível tornar-se um estrangeiro oficialmente conhecido, simplesmente visitando o país visinho—que, com o avanço do transporte mecanizado, tornou-se uma tarefa ainda mais comum. No início do século 20 a maior parte do mundo estava similarmente compartimentalizada. A era dourada da estrangeirice gentil iniciou. Os abastados, os artistas, os entediados, os aventureiros foram para o exterior. (As grandes massas foram também, quando os impérios, navios a vapor e estradas de ferro tornaram o viajar mais barato e fácil.) A estrangeirice era um meio de fuga—física, psicológica e moral. Em outro país é possível escapar da fácil classificação através da sua educação, seu trabalho, sua classe, sua família, seu sotaque, sua formação política. É possível reinventar a si mesmo, ainda que, só em sua mente. Não somos apanhados pelo mundanismo do local onde moramos, não mais do que gostaríamos de ser. Não votamos no governo, estes problemas não são seus. Somos irresponsáveis. A irresponsabilidade pode parecer, para moralistas, uma condição insatisfatória para um adulto, mas, na prática pode ser um grande alívio.Os escritores, em particular, parecem florescer no exílio, real ou autoimposto. As qualidades deste—deslocamento, ansiedade, desorientação, inconveniência, melancolia—tornam-se a sensibilidade literária moderna. Um escritor vivendo no estrangeiro pode reduzir as limitações percebidas do país e da cultura. Este não é mais um autor inglês, ou um autor irlandês, ou um autor russo, é simplesmente um Autor: pense em James Joyce, Christopher Isherwood, Vladimir Nabokov, Samuel Beckett, Joseph Brodsky. Tornou-se, e continua sendo, incorreto classificar o escritor pelo seu país. Todos desejam ser escritores do mundo, e o mundo retribui esta aspiração. Dos dez últimos vencedores do prêmio Nobel de literatura, cinco (V.S. Naipaul, Gao Xingjian, J.M. Coetzee, Doris Lessing e Herta Müller) eram emigrados. Um vencedor mais antigo do prêmio Nobel, Ernest Hemingway, estabeleceu as regras básicas para o escritor, como estrangeiro, quando constituía parte da comunidade expatriada em Paris em 1920: morar em Saint-Germain-des-Prés (ou equivalente), trabalhar em cafés, encontrar outros artistas, beber muito. Nem todos podem ser Hemingway. Muitos estrangeiros, atualmente, são estudantes comuns, gestores estafados, cônjuges acompanhantes. O homem expatriado em Bangkok é bem mais livre que a mulher expatriada em Jeddah. A parcela de estrangeiros involuntários é ainda pior. Uma vida de estrangeirice imposta pela pobreza ou perseguição ou exílio é improvável que se torne divertida de alguma maneira. Apesar disso, todas as outras coisas permanecendo iguais, a estrangeirice é intrinsecamente estimulante. Como um bom jogo de bridge, a condição de ser um estrangeiro envolve constantemente a mente, sem cansá-la. John Lechte, um professor Australiano de teoria social, caracteriza a estrangeirice como “uma fuga do tédio e da banalidade diários”. A mudança torna-se “super-real”, e vivenciada “com uma intensidade evocativa de eventos de uma biografia verdadeira”.Um psicólogo infantil, Alison Gopnik, ao procurar uma analogia para esclarecer o mundo quando vivenciado por um bebê, comparou com Paris vivenciado pela primeira vez por um americano adulto: uma representação da novidade, cor, e emoção. Reverter a analogia pode nos levar a perceber que viver num país estrangeiro pode evocar muitas das emoções da infância: novidade, surpresa, ansiedade, alívio, fraqueza, frustração, irresponsabilidade. Pode ser a sensação de voltar a infância que, conscientemente ou não, oferece ao prazer da estrangeirice sua parcela de embaraço. O narcisismo também pode fazer parte. Quando no exterior, imagina-se que os amigos e inimigos, em casa, sintam nossa falta. Por trás de tudo há a culpa pela traição. Escolher a estrangeirice é um ato de deslealdade para com o seu país de origem. A idéia de deslealdade é menos incômoda agora. Mas, há um século ou mais atrás, era uma marca de desvio comportamental para um cavalheiro inglês admitir o desejo de viver em outro local que não fosse a Inglaterra. O melhor argumento para passar algum tempo no exterior era o de que era possível avaliar melhor as virtudes do lar. “O que eles devem saber da Inglaterra, que apenas a Inglaterra sabe?” escreveu Kipling.


Sou um alien
Atualmente, é possível dizer que quanto mais conhecemos sobre outros países, mais nossos valores estarão incluídos em toda a humanidade. Preparamo-nos, começando com a antropologia. Todo estrangeiro com uma mente curiosa torna-se um antropólogo em meio período, admirando e sorrindo para os novos rituais sociais do seu país adotivo. George Mikes, um Húngaro vivendo na Inglaterra, escreveu um livro deste gênero chamado “How To Be An Alien”, (Como Ser um Estrangeiro) publicado em 1946. Este não era exatamente sobre como ser um estrangeiro, mas sobre a visão de um estrangeiro da sociedade britânica, e era muito engraçado. Mikes corretamente percebeu que a maioria dos códigos sociais possui algo de arbitrário e absurdo. Se acontecer de não constituirmos parte destes, como um estrangeiro jamais constitui, a vida pode ser uma contínua comédia.Mikes escreveu mais tarde, ironicamente, que esperava que seus amigos britânicos ficassem irritados com a imagem debochada que este retratou o país deles. No entanto, estes pareceram divertir-se muito. Mikes ridicularizou uma cultura suficientemente segura para rir dela mesma, e sua admiração e afeição por esta estavam claras. Entretanto, as coisas poderiam ter dado errado. Os estrangeiros reclamam mais que deveriam, e os nativos não gostam deles, se for escrever um livro chamado “Como Ser Um Estrangeiro” hoje, e desejar que este se torne um manual sério de instruções para ser utilizado em qualquer lugar do mundo, este deve consistir apenas de três regras. Pagar seus impostos, falar inglês e ser gentil com o país em que está vivendo. Extremamente gentil. Evitar inclusive críticas comuns. Não vá à casa de alguém e comece a mudar os móveis de lugar. Talvez, os estrangeiros são, por natureza, difíceis de satisfazer. Um estrangeiro é, afinal de contas, alguém que não gosta suficientemente do seu país para permanecer nele. Ainda assim, o estrangeiro queixoso demonstra certa contradição lógica. Este se queixa do país no qual se encontra, mesmo que esteja lá por opção. Por que não vai para casa? O estrangeiro responde a esta pergunta pensando em si mesmo como no exílio—se não no sentido judicial, mas no sentido espiritual. Algo dentro dele o levou para longe da sua pátria. Quase sente ciúmes do verdadeiro exílio. A vida no estrangeiro é uma aventura. Quanto maior poderia ser aventura, quanto mais intenso o sentimento de estrangeirice poderia ser, se não houvesse possibilidade de voltar? Para o verdadeiro exílio, a estrangeirice não é uma aventura, mas um teste de resistência. O poeta Romano Ovídio, banido para um canto úmido do império, queixou-se de que o exílio o estava arruinando “como um ferro armazenado é enferrujado por áspera corrosão/ou um livro armazenado atrai cupins”. Edward Said, um estudante palestino-americano nascido em Jerusalém, capturou o romance e a dor do exílio quando o chamou de “uma estranha atraente idéia, mas uma terrível experiência”. O verdadeiro exilado, diz ele, é alguém que não pode “voltar para casa nem em espírito nem de fato”, e cujas realizações são “permanentemente enfraquecidas pela perda de algo que foi deixado para trás para sempre”.O estrangeiro voluntário está exatamente na posição oposta, por um tempo, de alguma maneira. Seu prazer pela vida é intensificado, não enfraquecido, pela ausência da pátria. E a pátria é um local para o qual pode retornar a qualquer momento.


De dor e prazer
O engraçado é que, com o passar do tempo, algo acontece com os estrangeiros de longo prazo que os torna mais parecidos com verdadeiros exilados, e estes não gostam disso. A pátria que estes abandonaram muda. A cultura, a política, e seus velhos amigos mudam, morrem, os esquecem. Estes sentem-se estrangeiros, mesmo quando visitam o “lar”. Jhumpa Lahiri, uma britânica que escreve sobre descendentes Indianos vivendo na América, registra algo parecido em seu romance, “The Namesake” (O Homônimo). Ashima, que é um emigrado Indiano, compara a experiência da estrangeirice àquela de “um parênteses naquilo que uma vez foi uma vida comum, apenas para descobrir que a vida anterior desapareceu, foi substituída por algo mais complicado e exigente”.

Cuidado, então: não importa quão bem você supere, quanto você se divertiu, há uma perigosa ressaca em ser um estrangeiro, mesmo um estrangeiro gentil. Em algum lugar, bem escondido, espreita a saudade de casa, com metástases que com o passar do tempo levam a uma variável incurável, a nostalgia. E a nostalgia tem muito em comum com a ideia Freudiana de melancolia—uma sensação de perda contínua e debilitante, em algum lugar no qual repousa a raiva pela coisa perdida. Não é a possibilidade de retornar para casa que alimenta a nostalgia, mas a impossibilidade desta. Julia Kristeva, uma intelectual Búlgara estabelecida na França, mencionou esta sensação de privação comparando a experiência da estrangeirice com a perda de uma mãe.Mas, não podemos esperar ter tudo. A vida é cheia de escolhas, e escolher uma coisa é renunciar a outra. O dilema da estrangeirice se reduz ao dilema da liberdade versus fraternidade—os prazeres da liberdade versus os prazeres da propriedade. A pessoa caseira escolhe os prazeres da propriedade. O estrangeiro escolhe os prazeres da liberdade, e as dores que a acompanham.

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Benchmarking no Brasil

No mês de dezembro, empresários de Petrópolis/RJ e Bonito/MS, participantes do projeto Economia da Experiência, foram à região da Uva e do Vinho, no Rio Grande do Sul, para um benchmarking com o objetivo de ver de perto o resultado da implantação do projeto no local.

Os visitantes cariocas e mato-grossenses-do-sul puderam ver de perto a estruturação adotada pelo projeto para proporcionar aos turistas experiências únicas e originais. As ações propostas visam à diversificação da oferta turística e a ampliação do consumo, além de uma maior satisfação do cliente e o aumento na geração de emprego.

Apresentado aos visitantes por colaboradores do Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares (SHRBS), o projeto do Rio Grande do Sul, pioneiro no Economia da Experiência, explora o enoturismo, segmento da atividade turística motivado pela apreciação de vinhos, adaptando a oferta turística de acordo com os conceitos inovadores “Cidade dos Sonhos” e “Economia da Experiência”.

Para Márcia Ferronato, diretora do SHRBS, o encontro foi importante para a troca de informações entre os empreendedores de diferentes regiões. ”Cada lugar tem características próprias. Vivenciar e perceber as diferenças e as particularidades de cada região é muito importante. Mais que isso, é fundamental que essas características locais sejam exploradas para melhorarmos ainda mais o produto turístico”, explica.

Empreendedora participante do Projeto Economia da Experiência, Evany Noel, da agência de receptivo Imperial Tour, esteve no encontro e concorda que a estratégia de valorização dos aspectos locais, por exemplo, deva ser usada para valorizar o turismo em Petrópolis. “A cidade tem um patrimônio histórico muito grande, que foi construído na época de Dom Pedro II, e exploramos isso ao máximo, desde as decorações à Gastronomia. Por se tratar de uma cidade serrana, exploramos, também, a natureza local”, conclui.
Texto: Felipe Sato



Empreendedores de Bonito e Vanessa Leite do SEBRAE MS numa parada do passeio da Maria Fumaça

Empreendedores de Bonito vivenciando o passeio, As aventuras da minha infância, da agência de Toni Formaiari